Graças ao meu irmão, estou vendo de novo a série "Columbo", com o excelente Peter Falk. Grande sucesso na TV americana a partir do final dos anos 1960. Columbo é um detetive desengonçado e divertidíssimo. Nem Agatha Christie pensaria as formas mirabolantes como ele desvenda os crimes. O que chama atenção em Columbo é seu jeito de parecer que está só batendo papo, enquanto trabalha, investiga. Despretensioso, irônico, astuto, só esperando o momento certo para o bote; uma serpente prestes abocanhar sua presa a qualquer momento. Quando o suspeito sente o fungar em seu cangote, ele dispara: "eu estou só juntando as pontas, é do meu trabalho". Desvendar crimes é juntar pontas de uma historia mal contada; montar um quebra-cabeça. Ele faz isso com perfeição.
Mas o meu assunto aqui é outro. Sempre quando vem à tona a questão da felicidade, fico tentando juntar as pontas soltas também. Já escrevi em outras crônicas, mas vira e mexe volta com uma interrogação enorme, de pontas desconexas de fios desencapados. Por que tanta dedicação ao assunto? Por que tanta gente atrás da felicidade? E depois essa coisa óbvia, que ela está dentro de nós (clichê de livro de autoajuda). Isso, por si só, não justifica ou explica a felicidade, ou a sua ausência. Onde ela começa?
Deparei com uma postagem do Professor Olavo de Carvalho no Facebook, onde ele enaltece o porquê do povo americano ser o que é. (Ele mora lá há 10 anos). Sem tirar nem pôr: tem altivez, anda de cabeça erguida, tem compaixão, e felicidade fácil... Eu compreendo, eles não veem a vida sob o olhar malicioso, desconfiado, tão costumeiro a nós brasileiros. Eles levam a sério a vida, por que há seriedade no seu dia a dia; assim a felicidade fica parecendo ser uma coisa normal e corriqueira. Olavo ainda concluiu: quando eles veem em você o mínimo de coisa, que não seriam capazes de executar, dizem: "I am so proud of you".
A felicidade é um estado de ser, está no íntimo. Não há dúvida. Mas as suas causas são, sim, exteriorizadas. O que nos põe em contato com ela é o ambiente, ou poderia dizer, o que conspira e reina em torno à vida. Depois de ler "Foi nos EUA que pela primeira vez aprendi que a felicidade é normal", interpretei:
A felicidade não está no outro. Ela surge no acaso da vida, cotidianamente. Quando tudo que nos cerca é bom, liberto, verdadeiro, acolhedor, seguro e confiável. Não está entre quatro paredes, mas numa dimensão de nação. Numa atmosfera de prazer e esplendor. Vivemos num país onde as pessoas vivem buscando felicidade o tempo todo (?). O brasileiro tem síndrome da felicidade ausente, e por isso vive convergido no "vou ser feliz quando...". Esse "quando" nunca chega. Porque, o simples fato de ser normal, faz parecer tão distante, inatingível pelo próprio esforço. Isso (estado de bem-estar) tem a ver com esse mundo de fronteiras que nos cria e suas leis que nos governam. A política, a lealdade, a compaixão; depois o acesso ao trabalho, ao emprego, ao lazer, à moradia, à educação, à cultura; tudo junto e com respeito mútuo e cidadão. Longe ela está, mesmo, do mero encontro com o ser amado. A felicidade está na justiça.
Alguns leitores entenderam e outros não. Eu diria que, a maioria leu só a primeira linha, o óbvio ululante. É uma coisa nossa, brasileira, porque, de fato, temos pouco contato diário com o bem-estar coletivo. Ele se cria no mesmo instante que se desmancha. Há ainda o conceito, na forma egoísta, que felicidade só basta estar com alguém que gostamos numa cabana e acabou. Dane-se se o mundo está ou não em guerra, ou se há contas para pagar. Desde que eu esteja aconchegado, com o amor da vida, pode o mundo acabar.
Não é bem isso. A explicação está no comportamento, especialmente, de nós brasileiros: sempre carente clamando pela felicidade ausente, como um objeto de desejo. Então, pense comigo: o povo brasileiro é apaixonado por futebol e carnaval. Tudo que o faz viver momentos de felicidade instantânea como insights, quando somente assiste, sem participar (deleitar), porque a vida depois é dura, difícil e injusta. Por isso o carnaval, o futebol e outras diversões coletivas ganham proporções maiores que o simples lazer. Tomando o espaço que seria da convivência familiar: na rua, no trabalho, na escola, na vida, no encontro diário. O dia seguinte é uma ressaca moral de injustiça, dureza, dificuldades, falta de dinheiro e falta de perceptivas. A síndrome da quarta-feira de cinzas.
A felicidade deveria ser cotidiana e normal. Agora, quem é que sente isso morando num país inseguro, injusto, cercado por desigualdades, malandragem, corrupção e desgoverno? E tudo que, direta ou indiretamente, nos fere na alma, na honra. Essa atmosfera que nos faz sentir bem com tudo; essa atmosfera que nos coloca em contato com o self e o Criador; onde todos se somam, independente do seu poder aquisitivo e nível social; uma atmosfera de pessoas inteiras e verdadeiras. Onde está?
Poderia me fechar nesse egoísmo e dizer: se está bem para mim, que se dane o resto. Ao contrário, penso: se estiver bem para todo mundo eu também serei atingido pelo mesmo sentimento. Não dá para ser feliz sozinho (já disse o poeta), porque a felicidade não se sustentará por muito tempo entre quatro paredes. A felicidade não se sustenta, quando aguardamos um filho chegar tarde da noite da faculdade ou de uma balada. Aperto no peito, aflição, insegurança: isso não é felicidade. O bem-estar cotidiano deveria ser contagiante e duradouro. Isto é, felicidade sem medo.
Não quero pregar aqui essa coisa de mundo melhor com igualdade, de catequese socialista. (Pregam o que não vivem). Nenhum ser humano é igual ao outro. Se todos forem chefes, quem serão os empregados? É preciso que todos se sintam felizes dentro de suas posses e condições. Se há o empreendedor, deverá haver quem o ajude a empreender. Não existe empregado sem patrão, como querem. Para isso há que se ter justiça reinando em tudo que se faça. Não ostentar posses e coisas, mas o bem-estar. Com respeito e admiração e não com inveja.
Não quero pregar aqui essa coisa de mundo melhor com igualdade, de catequese socialista. (Pregam o que não vivem). Nenhum ser humano é igual ao outro. Se todos forem chefes, quem serão os empregados? É preciso que todos se sintam felizes dentro de suas posses e condições. Se há o empreendedor, deverá haver quem o ajude a empreender. Não existe empregado sem patrão, como querem. Para isso há que se ter justiça reinando em tudo que se faça. Não ostentar posses e coisas, mas o bem-estar. Com respeito e admiração e não com inveja.
Quem é que não fica feliz ao ver a justiça acontecendo? Só não fica quem anda à margem da lei, na criminalidade, na contravenção do mundo. Porque a maioria das pessoas (que trabalha, paga impostos e se sustenta) pensa como eu. Eu não quero ser feliz sozinho, mesmo porque não teria com quem partilhar.
Poderia citar mil coisas aqui que nos faz feliz e não depende só de nós, mas de quem cuida da nossa vida, por governo. Então, fui ler a etimologia da palavra "governo", encontrei: "Do L. GUBERNATOR, 'diretor, líder, governador', originalmente 'timoneiro', do Grego KYBERNAN, 'pilotar ou ir ao leme de um navio, dirigir', palavra que originou nossa 'cibernética'”. Enquanto tocamos nossa vida cotidianamente, alguém dirige o leme da embarcação que é a cidade, o país, a nação, enfim, o governo. Quando ele é um bom timoneiro, nos sentimos seguros dentro da embarcação; não nos preocupamos com icebergs e maremotos. Confiamos que estamos sendo bem guiados. Isso nos dá segurança de viver; isso nos dá conforto; isso nos dá prazer; isso nos traz também felicidade.
Poderia citar mil coisas aqui que nos faz feliz e não depende só de nós, mas de quem cuida da nossa vida, por governo. Então, fui ler a etimologia da palavra "governo", encontrei: "Do L. GUBERNATOR, 'diretor, líder, governador', originalmente 'timoneiro', do Grego KYBERNAN, 'pilotar ou ir ao leme de um navio, dirigir', palavra que originou nossa 'cibernética'”. Enquanto tocamos nossa vida cotidianamente, alguém dirige o leme da embarcação que é a cidade, o país, a nação, enfim, o governo. Quando ele é um bom timoneiro, nos sentimos seguros dentro da embarcação; não nos preocupamos com icebergs e maremotos. Confiamos que estamos sendo bem guiados. Isso nos dá segurança de viver; isso nos dá conforto; isso nos dá prazer; isso nos traz também felicidade.
Lá do outro lado do mundo ou aqui mais próximo, não dá para ser feliz vendo injustiça e miséria.
Olhando para o país nesse exato momento, vejo o brasileiro, forçadamente (não espontâneo), começando a tomar sentido de si. Depois de perceber os alicerces da nossa democracia sendo abalados por um governo para lá de corrupto; depois de não enxergar um país justo para suas gerações futuras, começou a reagir.
O primeiro estágio é do reconhecimento, que muita coisa vai mal, e é preciso se mexer. Reconhecer que Lula, por exemplo, não passa de um farsante, um vigarista abjeto. Agora, só isso também não basta; ou dizer "ladrão!", da boca para fora nas redes sociais, e no íntimo ainda continuar cultivando a inveja da sua malandragem. Lembrando que, até pouco tempo, Eike Batista tinha milhares de seguidores da sua fortuna, por inspiração e por inveja.
No íntimo, o brasileiro ainda gosta e inveja a malandragem alheia; aquele sujeito que se deu bem, não importa os meios — lei de Gerson. Se tivesse a oportunidade, e poder, faria o mesmo. É preciso agora — estamos caminhando para isso —, com o reconhecimento, mudar essa mentalidade. Mudar o sentido do leme, a forma de pensar a vida; olhar para o mar revolto tomando à frente e pôr o país de volta no rumo, navegando em águas calmas, sob ética e moral. Felicidade é possível, sim, na sua amplitude e com justiça.
Por enquanto, como sempre age o personagem de Peter Falk, estamos ainda juntando as pontas de nossa identidade perdida, para se encontrar de novo, quiçá, num país mais civilizado e melhor. Eu queria mesmo é que todas as pontas já tivessem juntadas e muito bem atadas, mas isso irá demorar...
Por fim, pegando pelo avesso dessa conversa, existe um porquê da pescaria marítima em Cuba ser proibida pelo governo. Você pode perguntar: eles não gostam de peixe de mar ou pensam na preservação de alguma espécie? Não, nada disso. Simplesmente, porque embarcações mar adentro são um convite à fuga fácil da ilha/prisão. E isso é um caminho sem volta no mar: o anseio esperançoso de um povo triste e oprimido ao encontro de terras onde há liberdade e, quem sabe, um derrame de felicidade.
© Antônio de Oliveira / cronista, arquiteto e urbanista / Abril de 2015.
Olhando para o país nesse exato momento, vejo o brasileiro, forçadamente (não espontâneo), começando a tomar sentido de si. Depois de perceber os alicerces da nossa democracia sendo abalados por um governo para lá de corrupto; depois de não enxergar um país justo para suas gerações futuras, começou a reagir.
O primeiro estágio é do reconhecimento, que muita coisa vai mal, e é preciso se mexer. Reconhecer que Lula, por exemplo, não passa de um farsante, um vigarista abjeto. Agora, só isso também não basta; ou dizer "ladrão!", da boca para fora nas redes sociais, e no íntimo ainda continuar cultivando a inveja da sua malandragem. Lembrando que, até pouco tempo, Eike Batista tinha milhares de seguidores da sua fortuna, por inspiração e por inveja.
No íntimo, o brasileiro ainda gosta e inveja a malandragem alheia; aquele sujeito que se deu bem, não importa os meios — lei de Gerson. Se tivesse a oportunidade, e poder, faria o mesmo. É preciso agora — estamos caminhando para isso —, com o reconhecimento, mudar essa mentalidade. Mudar o sentido do leme, a forma de pensar a vida; olhar para o mar revolto tomando à frente e pôr o país de volta no rumo, navegando em águas calmas, sob ética e moral. Felicidade é possível, sim, na sua amplitude e com justiça.
Por enquanto, como sempre age o personagem de Peter Falk, estamos ainda juntando as pontas de nossa identidade perdida, para se encontrar de novo, quiçá, num país mais civilizado e melhor. Eu queria mesmo é que todas as pontas já tivessem juntadas e muito bem atadas, mas isso irá demorar...
Por fim, pegando pelo avesso dessa conversa, existe um porquê da pescaria marítima em Cuba ser proibida pelo governo. Você pode perguntar: eles não gostam de peixe de mar ou pensam na preservação de alguma espécie? Não, nada disso. Simplesmente, porque embarcações mar adentro são um convite à fuga fácil da ilha/prisão. E isso é um caminho sem volta no mar: o anseio esperançoso de um povo triste e oprimido ao encontro de terras onde há liberdade e, quem sabe, um derrame de felicidade.
© Antônio de Oliveira / cronista, arquiteto e urbanista / Abril de 2015.
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