Se eu pudesse intervir no tempo e mudar as estações do ano, eu faria tudo começar com a primavera. Tem tudo a ver com o início da vida: os dias, suas flores e cores sem fim; onde tudo parece se realizar e transformar. Nos dias da criação, não tenho dúvida que era primavera. Deus criou tudo a partir dali. Toda a beleza do mundo foi criada primeira e depois veio o resto. Esta estação encanta, dá alento e esperança; e o sentimento é de renovação e mudanças, com dias claros de contemplação. Eu sempre escolho a primavera para arrumar as gavetas da alma e dar o próximo passo adiante.
Na vida sempre iremos recomeçar algo, do marco zero. Ninguém está livre disso. Há momentos — e aqui eu falo da vida de todos nós — em que haverá um divisor de águas, um barco à deriva que muda sua rota, um novo rumo onde mudanças ocorrerão: um casamento (ou divórcio), o nascimento de um filho, um novo emprego, uma nova moradia, outro lugar ou um novo amor... Também não nos esqueceremos das passagens tristes por acidentes e desastres — esses nunca planejados. Essas fases ficarão perpetuadas nas nossas memórias. É a primavera mudando nossas vidas.
Faz alguns anos vi um filme nacional cujo enredo se baseava em: “a vida tem sempre o lado B” — fazendo uma alusão aos discos “long-playing” —, e na minha modesta tradução, sintetizei: na dificuldade, alterne, vire o disco! Termo este que muitos jovens já ouviram, mas não sabem de onde vem. Vem daí. Em 2000, a revista americana MTV elegeu a música “Yesterday”, a melhor música pop de todos os tempos — o que concordo. No álbum “Help!” dos Beatles — 1965 , “Yesterday” é a penúltima música do lado B, a 13ª música do disco. Às vezes, as melhores músicas estão tocando no lado B de nossas vidas. É preciso virar o disco para desvendá-las e deixá-las entrar.
Nessa toada, nos apontam todos os caminhos, quando a vida diz não para um lado, abrirão outras portas para um novo sentido: vire o disco. Agora a deixo assim, seguir seu norte. Onde vai dar? São minhas escolhas, que apontarão as setas do caminho, iluminado por uma luz espiritual, que me permito a todo o momento. Tenho falado: à vida fazemos as escolhas e ela se posicionará para o lado que está o leme que remamos. Quem insiste e perde tempo com as pessoas erradas, não obstante, terá tempo depois para encontrar e amar a pessoa certa.
É fato, viemos a esta vida fadados a fazer escolhas; e isso começa desde quando nossos pais nos soltam das mãos e então damos os primeiros passos sozinhos. Assim, esticamos nossos bracinhos para o colo de quem queremos ir. Como um filhote de águia que despenca do ninho e aprende a dar seus primeiros rasantes: voamos, voamos por aí buscando alimentos para corpo e para alma. A partir daí nos sentimos livres para fazer o que bem queremos dela; e por ela fazemos muitas opções. Malgrado, para outros é optar até pela morte em detrimento à vida, como muitas tragédias têm mostrado. É claro, a cartilha da boa educação e moral nos é dada também já no engatinhar, tendo também a opção de seguir ou não na fase da consciência.
Depois de sofrer muita resistência e dor, hoje uma amiga aceita a condição de vida de seu pai e sua relação com ele. Aprendeu a amá-lo como ele é; com seus defeitos e qualidades. Ela me disse: “ele escolheu esta vida para ele, isto mesmo antes de eu nascer. Não posso mudar, ele fez suas escolhas. Aprendi agora a amá-lo assim”. Todos os dias nós acordamos já fazendo tais escolhas: banho frio ou quente? Com que roupa eu vou? O quê comer? E no nosso estado de espírito também: como iremos encarar o primeiro que depararmos no elevador ou na rua, com sorriso ou cabisbaixo?
“Sempre achei que estivesse escondida numa concha no fundo do mar”. Quando ouvi esta frase me trouxe uma sensação de que vivemos buscar alguém que está longe dos nossos olhos e do alcance das mãos. Sonhamos com o impossível, a perfeição — talvez, até porque não somos. Achando que só iremos encontrar nossas pérolas, em conchas nos reinos abissais mais profundos. E assim, corremos em busca da perfeição. Haverá uns que brilharão em suas manhãs mais singelas de primavera; há outros que se ofuscarão até ao maior brilho do sol. Esta é vida e o tom que cada um dará a ela. Algo de errado está nos nossos olhos que vivem a buscar o mar com suas riquezas infinitas e inatingíveis, e cegam para outras tão perto e possíveis.
Fazer opção pela sua vida é dar sentido a ela própria. Parece ser conversa fiada, mas nem sempre é assim, muitos castram seus projetos para fazer outras escolhas, viverem a vida que não é sua, e se perdem por aí. Por volúpia ou paixão, às vezes nos confrontamos com lampejos de sentimentos do qual não dominamos e por eles deixamos tudo, e trocamos a nossa pela vida do outro. Isto ocorre com a maioria das mulheres, que, em busca de uma relação perfeita, obedecem a seus cônjuges e se abdicam de seus projetos de vida em prol de um casamento, pensando na sua eternidade. Um dia, acordarão no tédio, já maltrapilhas, sem espelho e sem identidade. A tarefa árdua agora é juntar os cacos, colocar no lugar tudo que espalhou pelos cômodos — a casa agora precisa de uma boa faxina. Mas ainda haverá tempo de se buscar a nova primavera.
Agora escolho esta manhã de primavera (quando entrar setembro e a boa nova andar nos campos...) e tudo que me renova. Vou abrir todas as janelas da alma e contemplar as cores do dia; vou dar o perdão, vou partilhar o bem, vou tomar meu café sem tempo para sair da mesa, vou despedir da tristeza, vou encontrar com o amor. Nesta manhã de primavera vou andar descalço, vou rir de tudo, vou cumprimentar meu vizinho, vou abrir o coração, vou fechar um livro com lágrimas de emoção, vou começar outro com devoção; vou orar mais um pouquinho, vou trocar de leme e continuar remando.
Nesta manhã de primavera, vou escolher a minha melhor roupa, vou pintar uma tela, vou acreditar no amor, vou fazer nova amizade, vou transgredir, vou ver o mar... Nesta manhã de primavera vou pôr na vitrola e ouvir “Yesterday”, a penúltima música do lado B da trilha sonora da minha vida.
A cada primavera eu renasço, como um réveillon em fogos de artifício e em pétalas de flores. Leva-me daqui, desse inverno, desta dor. Se tiver que escolher, escolho agora esta manhã para renascer. Das estações, eu escolhi a primavera. E você?
© Antônio de Oliveira / arquiteto e urbanista / setembro de 2010.
Na vida sempre iremos recomeçar algo, do marco zero. Ninguém está livre disso. Há momentos — e aqui eu falo da vida de todos nós — em que haverá um divisor de águas, um barco à deriva que muda sua rota, um novo rumo onde mudanças ocorrerão: um casamento (ou divórcio), o nascimento de um filho, um novo emprego, uma nova moradia, outro lugar ou um novo amor... Também não nos esqueceremos das passagens tristes por acidentes e desastres — esses nunca planejados. Essas fases ficarão perpetuadas nas nossas memórias. É a primavera mudando nossas vidas.
Faz alguns anos vi um filme nacional cujo enredo se baseava em: “a vida tem sempre o lado B” — fazendo uma alusão aos discos “long-playing” —, e na minha modesta tradução, sintetizei: na dificuldade, alterne, vire o disco! Termo este que muitos jovens já ouviram, mas não sabem de onde vem. Vem daí. Em 2000, a revista americana MTV elegeu a música “Yesterday”, a melhor música pop de todos os tempos — o que concordo. No álbum “Help!” dos Beatles — 1965 , “Yesterday” é a penúltima música do lado B, a 13ª música do disco. Às vezes, as melhores músicas estão tocando no lado B de nossas vidas. É preciso virar o disco para desvendá-las e deixá-las entrar.
Nessa toada, nos apontam todos os caminhos, quando a vida diz não para um lado, abrirão outras portas para um novo sentido: vire o disco. Agora a deixo assim, seguir seu norte. Onde vai dar? São minhas escolhas, que apontarão as setas do caminho, iluminado por uma luz espiritual, que me permito a todo o momento. Tenho falado: à vida fazemos as escolhas e ela se posicionará para o lado que está o leme que remamos. Quem insiste e perde tempo com as pessoas erradas, não obstante, terá tempo depois para encontrar e amar a pessoa certa.
É fato, viemos a esta vida fadados a fazer escolhas; e isso começa desde quando nossos pais nos soltam das mãos e então damos os primeiros passos sozinhos. Assim, esticamos nossos bracinhos para o colo de quem queremos ir. Como um filhote de águia que despenca do ninho e aprende a dar seus primeiros rasantes: voamos, voamos por aí buscando alimentos para corpo e para alma. A partir daí nos sentimos livres para fazer o que bem queremos dela; e por ela fazemos muitas opções. Malgrado, para outros é optar até pela morte em detrimento à vida, como muitas tragédias têm mostrado. É claro, a cartilha da boa educação e moral nos é dada também já no engatinhar, tendo também a opção de seguir ou não na fase da consciência.
Depois de sofrer muita resistência e dor, hoje uma amiga aceita a condição de vida de seu pai e sua relação com ele. Aprendeu a amá-lo como ele é; com seus defeitos e qualidades. Ela me disse: “ele escolheu esta vida para ele, isto mesmo antes de eu nascer. Não posso mudar, ele fez suas escolhas. Aprendi agora a amá-lo assim”. Todos os dias nós acordamos já fazendo tais escolhas: banho frio ou quente? Com que roupa eu vou? O quê comer? E no nosso estado de espírito também: como iremos encarar o primeiro que depararmos no elevador ou na rua, com sorriso ou cabisbaixo?
“Sempre achei que estivesse escondida numa concha no fundo do mar”. Quando ouvi esta frase me trouxe uma sensação de que vivemos buscar alguém que está longe dos nossos olhos e do alcance das mãos. Sonhamos com o impossível, a perfeição — talvez, até porque não somos. Achando que só iremos encontrar nossas pérolas, em conchas nos reinos abissais mais profundos. E assim, corremos em busca da perfeição. Haverá uns que brilharão em suas manhãs mais singelas de primavera; há outros que se ofuscarão até ao maior brilho do sol. Esta é vida e o tom que cada um dará a ela. Algo de errado está nos nossos olhos que vivem a buscar o mar com suas riquezas infinitas e inatingíveis, e cegam para outras tão perto e possíveis.
Fazer opção pela sua vida é dar sentido a ela própria. Parece ser conversa fiada, mas nem sempre é assim, muitos castram seus projetos para fazer outras escolhas, viverem a vida que não é sua, e se perdem por aí. Por volúpia ou paixão, às vezes nos confrontamos com lampejos de sentimentos do qual não dominamos e por eles deixamos tudo, e trocamos a nossa pela vida do outro. Isto ocorre com a maioria das mulheres, que, em busca de uma relação perfeita, obedecem a seus cônjuges e se abdicam de seus projetos de vida em prol de um casamento, pensando na sua eternidade. Um dia, acordarão no tédio, já maltrapilhas, sem espelho e sem identidade. A tarefa árdua agora é juntar os cacos, colocar no lugar tudo que espalhou pelos cômodos — a casa agora precisa de uma boa faxina. Mas ainda haverá tempo de se buscar a nova primavera.
Agora escolho esta manhã de primavera (quando entrar setembro e a boa nova andar nos campos...) e tudo que me renova. Vou abrir todas as janelas da alma e contemplar as cores do dia; vou dar o perdão, vou partilhar o bem, vou tomar meu café sem tempo para sair da mesa, vou despedir da tristeza, vou encontrar com o amor. Nesta manhã de primavera vou andar descalço, vou rir de tudo, vou cumprimentar meu vizinho, vou abrir o coração, vou fechar um livro com lágrimas de emoção, vou começar outro com devoção; vou orar mais um pouquinho, vou trocar de leme e continuar remando.
Nesta manhã de primavera, vou escolher a minha melhor roupa, vou pintar uma tela, vou acreditar no amor, vou fazer nova amizade, vou transgredir, vou ver o mar... Nesta manhã de primavera vou pôr na vitrola e ouvir “Yesterday”, a penúltima música do lado B da trilha sonora da minha vida.
A cada primavera eu renasço, como um réveillon em fogos de artifício e em pétalas de flores. Leva-me daqui, desse inverno, desta dor. Se tiver que escolher, escolho agora esta manhã para renascer. Das estações, eu escolhi a primavera. E você?
© Antônio de Oliveira / arquiteto e urbanista / setembro de 2010.
2 comentários:
Tambem escolhi a primavera como a mais linda estação, quem dera só tivessemos primavera.
Parabens pelas belas palavras muito bem distribuidas no seu texto!
Esolhi: hoje, agora! Todos os dias renovada. A expectativa. No inverno do meu ser, quando na superfície, a ilusão do nada, a vida transformada, composições feitas, na quietudade, na consciência distraída, no silêncio, de surpresa, de mansinho, a vida irrompe. Abraça. Todos os dias traduzida em primavera. Seiva que vagarosamente alimenta. Beija, amorosamente. Reverencia. Escolhi! Todas as estações que há vida. Opera. Toca. Cria. Honra a vida que teu Deus lhe deu. Sopro. Tentáculos que suavemente enredam, convencem, não desistem da vida, não desistem de mim.
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