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quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Por você, faria isso mil vezes


Eis que, o ano nem acabou e cá estou escrevendo algumas linhas. Eu, que prometi não escreveria uma linha a mais, guardaria tudo para o ano que se prenuncia: os tempos melhores. Quebro a promessa. Às vezes são as palavras que nos procuram, nos rodeiam, insistem - elas precisam sair. Começo agora em 2010 para findar no próximo ano, falando um pouco de saudade e amor. O amor de “parceros”.

A saudade é o revés de um parto; a saudade é arrumar o quarto do filho que já morreu...”. Muitos consideram estes versos da canção de Chico Buarque um dos mais fortes e marcantes – também assinto. Eu diria que é mais do que um jorro, mas uma das melhores explicações para esta coisa que dói tanto, que se chama saudade. Só as mães saberão dizer se é... Dizem que não há tradução em inglês. Talvez, porque os povos dessa língua não queiram saber dela, do sofrimento que ela trás junto – abnegam. Nós gostamos de dizer, que temos e sentimos. A saudade é uma doença da alma e sua cura só vem com o tempo; o mesmo tempo que temos para sobreviver na dor é o tempo da saudade. Para isso, o tempo também passa – ainda bem.

O quanto damos de valor às pessoas com quem convivemos? No meu último texto em 2010, disse que o Natal será sempre feliz, mesmo lembrando das pessoas queridas que nos deixaram; afinal, as crianças estão aí na sua pureza nos preenchendo com alegria e apagando a chama da dor que teima em arder. Mas, quando há perdas, não há Natal feliz; nem as crianças e nem mesmo a renovação do espírito natalino, conseguem cear conosco. Para perdas não há remédio, só o tempo. É dor mesmo.

Só quem é corajoso consegue encarar a morte e se arriscar aos seus chamamentos. Quando pessoas jovens morrem, penso que foram corajosas em ir tão cedo. Desafiaram o perigo, a última dor. Não se preocuparam com a dor de quem ficou, como se tivesse a opção de escolher, ou fossem donos do seu destino. Não somos donos de nada, nem da vida e nem da morte. Tudo que temos pertence a Deus. Quando pessoas queridas se vão, perguntamos: Por que hoje? Por que não me avisou? Por que não desviou o caminho? Por que não ficou aqui? São tantos os porquês e as respostas pairando no ar. Buscamos o conforto no colo do pai do céu. Só ele nos dá o consolo, a condição de olhar a vida novamente e encará-la de cabeça erguida.

Já escrevi em outra crônica, dos desafios que a juventude não tem medo de enfrentar. Sempre será assim, foi comigo e será com todos. Nos meus 20 anos, lembro que ia brincar meu carnaval no clube, e muitas vezes, eu e meus amigos íamos ou voltávamos em cima da carroceria de uma caminhonete, cujo motorista, mal conhecíamos e fazia manobras arriscadas. Dávamos gargalhadas da aventura e com o vento no rosto gritávamos: “massa! O cara é massa!”. Hoje, agradeço ao meu anjo da guarda, ele ia comigo sempre nessas aventuras. Mas, às vezes os anjos adormecem, ou se distraem por um segundo.

Um dos maiores sentimentos que Deus nos deu, foi o amor que vem da amizade. Este amor rompe fronteiras, distâncias, medos, angústias; ele vai além da vida... O amor por quem amamos na amizade, nunca morrerá. É para sempre o amor de “parcero”. Os amigos, nunca se esquecerão daquele que partiu, se arriscou na carroceria da caminhonete em alta velocidade, ou daquele que sumiu na curva da estrada e nunca mais olhou para trás. Ser amigo, “parcero” e verdadeiro é para poucos. Como qualquer outra relação, a amizade se constrói na doação, no companheirismo, na cumplicidade, no respeito, nos gestos. Gosto de assistir amizades verdadeiras. Fazer coisas por um amigo, que não fariam por ninguém mais, é amizade de “parcero”.

Maior que a nossa própria dor é a dor alheia; aquela que não está em nós, mas de maneira simbiótica nos contagia, nos arrepia e choramos juntos. Foge ao controle, rezamos, suplicamos e abraçamos. O que fazer para estancar a dor de quem só se vê triste? No livro “O caçador de pipas” — Khaled Hosseini (2003), Amir tinha uma dívida de honra e de amor para com seu melhor amigo; e agora ele precisava provar este amor que tanto negou, mas nunca o abandonou: amor de “parcero”. Ao contrário, seu amigo Hassan nunca deixou de declarar o seu amor. Com a coragem que nunca imaginou ter, Amir salva o filho de Hassan — seu sobrinho revelado — das mãos do Taliban. Amir fez o que seu amigo faria por ele. Depois, Amir precisava mais do que enxugar as lágrimas nos olhos do pequeno Sohrab, ele precisava botar alegria em seu rosto – a dor alheia. Quando o garoto viu a pipa no céu, Amir não acreditou, um sorriso se construiu no rosto da criança. A morte já não doía mais, era passado. Era tudo o que de melhor conseguiu realizar em toda sua vida; era luz, era ouro, era Divino, era o céu, eram estrelas... E a única coisa que Amir pode fazer no momento que a pipa se cortou, foi correr desesperadamente atrás dela — num gesto que seu amigo fazia sempre por ele —, dizendo: “Por você, eu faria isso mil vezes!”. Isso é amor. Isso é amizade de “parcero”.

(*) dedicado ao Juninho (em memória) , a todos os seus “parceros”, em especial, ao meu querido Thiago.

© Antônio de Oliveira / arquiteto e urbanista / janeiro de 2011.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

2010...2011 - Um balanço geral


Caros leitores (as),
O Blog encerra as atividades em 2010, mas promete voltar com tudo em 2011. É hora de fechar as portas e fazer o balanço anual.

Vou abrir um champanhe! Em 2010, foram mais de 7.000 visitas contabilizadas. Lembrando que, o marcador de estatísticas oficial do Blog só começou a registrar a partir de Junho, e o Blog foi criado em Abril. Portanto, estimo que tenha ultrapassado 8.000 visitas. Uma média de 800 visitas/mês.

Fico feliz e orgulhoso, pois nem era minha intenção virar o que virou; e grande parte disso tudo, se deve aos poucos leitores, seus comentários pertinentes e de incentivo que recebi ao longo desses 09 meses. Tudo virou fermento na alma. Como sempre disse, é prazeroso escrever com liberdade e sem o compromisso de ser “politicamente correto”. Escrevi, muitas vezes, pelo lado do “incorretismo” mesmo, sem medo de errar ou dizer algo que fosse contrário ao pensamento da maioria. Dos 20 textos que escrevi, devo ter contrariado desde Chico Buarque a Freud. Mas, e daí? Não quero e nem pretendo ser um pensador ou levantar bandeiras sobre quaisquer pensamentos. Convenço-me muito fácil quando existe a lógica, a razão e a verdade no meio; e quem levanta bandeiras abomina qualquer questionamento. No fundo, faço disso a exposição de minhas ideais. Sendo elas: boas ou não, transitórias ou perenes, e aceitando sempre discordâncias.

Só para notificação, segundo as estatísticas do Blog, o texto "O ótimo, o medíocre e o idiota. Ou: Agora falando sério, Chico..." foi o mais lido, com quase 900 acessos. Por se tratar de um texto que fala de política (num momento propício) - e se tratando também de um ídolo (meu, inclusive) -, acabou tendo toda a repercussão que teve. Na seqüência, veio o texto "Eu quero uma casa no campo", com quase 300 acessos. Destes 20 textos, somente dois foram escritores em anos anteriores: "É só aguardar..." - 2008; e "A mulher árabe"- 2007.

Quando comecei, em Abril, eu já havia escrito 03 textos. Ainda sem o Blog, os textos iam por e-mail para um seleto grupo de amigos; chegando a postar também no Portal São José dos Campos Um dia, alguém me sugeriu a ideia de criar meu próprio canto – abrigar minhas palavras num lugar só. Foi aí que nasceu o Blog. A coisa cresceu, pois a exposição foi maior, com a divulgação também nas redes sociais.

Resumindo 2010, eu diria que foi o ano da paz, do silêncio... Só escrevemos no silêncio da alma, quando verdadeiramente estamos conosco e acolhidos no nosso íntimo, agora apaziguado. Quando ouvimos somente a voz do coração - sem gritos e lamentos externos. 2010, foi o ano do meu silêncio. Assim, como meus projetos arquitetônicos, escrever também requer paz, silêncio e com um bocado de inspiração.

Para quem não leu nenhum, ou ficou sem ler alguns dos textos, segue abaixo a listagem das crônicas. Excluindo dessas: os lembretes, comentários, as conversas e publicações fora da minha autoria. Clique e leia. A espera de 2011. Até lá!

UM FELIZ ANO NOVO!


CRÔNICAS - 2010

01 - O reconhecimento do amor

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

O presente de Natal


Quando decidimos reformar a casa, pedi licença à memória de meu pai — o arquiteto — e me atrevi a arranjar o projeto. Comecei e saiu. Queria ter sido mais que o arquiteto, queria ser o eterno morador da casa que meu pai construiu. Onde vivi os melhores anos da minha vida.

A arquitetura é para viver, isso já foi um conflito, agora é um conceito que carrego comigo, quando ainda sonhava com a carreira. A peleja da forma versus a função. Nossos mestres insistiam nessa polarização, que brigava um mundo belo com o necessário. Sempre pensei e me pus ao lado de que tudo tem um porquê; mesclando função com a estética: a minha arquitetura. Há que ter vida na arte para que não caia na frieza, insossa — capa de revista. Arquitetura tem alma!

Sem saber disso, meu pai foi idealizador e construtor da nossa casa. Ele, contudo, não teve um projeto discutido e aprovado; nem um par de esquadros, um escalímetro e muito menos dispunha de um Neufert para consultar antes de iniciar a sua obra. Havia, todavia, a necessidade de abrigar a família, dar guarida com alguns milheiros de tijolos de barro. Era tudo o que tinha a mão e no coração.

A casa é meu pai, ele é a casa eterna que morávamos; e somente ele a pôs de pé. O arquiteto da nossa vida. Minha irmã, não entendeu e não a culpo por isso: não ver alma por dentro do barro do tijolo. Havia pressa em retornar à velha casa e também ansiedade. Como cobrá-la a entender de arquitetura enquanto punha água para ferver, se também não sou cobrado por entender de culinária; e o máximo que aprendi sobre esta arte foi fritar um bife acebolado. Ela nunca soube quem foi Mies van der Rohe, ou quem projetou a casa da cascata foi Frank Lloyd Wright — como gomos que saem das pedras com a queda d'água. Nunca também soube, que Gaudí esculpia sua arquitetura nas formas humana e depois de pronta a desenhava: curvas sem fim.

O pedreiro também não entendeu, o pintor se esquivou. Por que o nicho na parede a revelar a parede velha, desbotada? Havia a demão da tinta, a primeira. Ela não é velha; velha é nossa dor. A cor e suas nuances me remetem ao passado: o rosa velho que meu pai pintou antes. Era a última casca de tinta, depois dela era o reboco e os tijolos de barro (sua alma). Aquela cor rosa velho era o paspatur do retrato do arquiteto construtor. Arquitetura só existe para mim se tem memória eterna. E a memória nos trás lágrimas nos olhos. A arquitetura me emociona. O pintor pintou sobre a memória com tinta branca.

Era Natal. Depois da missa do Galo, íamos para casa comer a modesta ceia preparada por minha mãe. Aquela casa pequena de parede cor rosa velho — meu pai a pôs de pé. Era raro o Natal que ele estava conosco. O trabalho, muitas vezes, o consumia até na noite de Natal. Era um preceito, pôr pão na nossa mesa. A cozinha era quente, no forno havia assados que minha mãe preparava. E a criança resistia ao sono à espera da meia noite e assim celebrar: é Natal! Depois da reza, ceávamos e conversávamos um pouco mais, para depois ir para cama. Enquanto desenrolava a conversa, com os olhos caídos de sono, eu contemplava o Menino Jesus no presépio. Era um tempo de luz incandescente e amarela, como fotografia.

Era o nascimento da esperança: como será o próximo Natal? Não havia presentes e nem árvore de bolas coloridas. Montávamos um pequeno presépio sobre a mesinha de madeira que ficava ao lado do aparelho de TV preto e branco. Os presentes vinham antes do Natal. A fábrica onde meu pai trabalhava, era o verdadeiro papai Noel que acreditávamos. Ela nos dava o único presente que ganhávamos no Natal. Nunca falhava, apesar de não poder escolher o que ganhar. Os presentes eram distribuídos conforme a idade e sexo.

Houve um Natal, porém, que o presente não veio. Meu pai adoeceu e a fábrica o afastou. Não fomos à festa de entrega e muito menos tivemos brinquedos. Esqueceram de nós. A desolação era percebida. Como um Natal sem brinquedos? Era verdade, mas não chorei (eu sentia, mas não chorava). O Natal passou sem presente. Como cobrá-lo? Aceitei calado. 
 
Alguns dias se passaram depois do Natal, e uma Kombi estacionou à nossa porta. Eu não acreditava e meus olhos brilhavam. A Kombi estava cheia de brinquedos para nós. Não que todos fossem para nós, mas havia a possibilidade de escolher um entre muitos. Até me esqueci que o Natal já havia passado. As visões que me vêm não me trazem à lembrança a cor da Kombi, se era branca, vermelha ou azul; mas de uma coisa eu não me esqueço: havia muitas bolas gigantes de plástico. Não sei qual foi o brinquedo que escolhi, não me lembro. 
 
Hoje, acredito que o serviço social da empresa, tenha sentido nossa falta no dia da entrega dos presentes e quis, assim, reparar o erro mandando aqueles brinquedos depois. Da minha cabeça, nunca mais saiu esta cena, quando a Kombi estacionou no meio da rua e o motorista perguntou pelo meu pai. Foi um dia feliz.

Acostumei-me a não ganhar muitos brinquedos na infância, e por isso me lembro dos poucos que tive. Como meu irmão escreveu em sua crônica (Você já aprendeu a descascar laranja?), nossa infância nos reservou habilidades de construir, muitas vezes, o nosso próprio brinquedo. Num aniversário — tão raro de se comemorar — eu ganhei um bumbo de plástico e com ele ensaiava uma percussão que mais atormentava do que agradava as pessoas. Lembro-me também de um caminhão basculante, de cabine vermelha e caçamba amarela — este já no Natal. Depois outro: uma mini-mesa de sinuca. 
 
Havia na minha rua, um menino que tinha muitos brinquedos em seu quarto. Brinquedo caros, diga-se. Quando era convidado, eu ia lá brincar de autorama, de forte apache e com um pião prateado gigante que, além de ter som, piscava uma luz vermelha. Eu adorava, embora soubesse que não era meu. Eu só brincava quando ele me deixava pôr a mão.

Eu já tinha 18 anos, quando meu pai partiu. Foi em 23 de dezembro de 1981. Um edema pulmonar o levou na véspera do Natal. Eu estava na sala de espera do hospital, quando o médico trouxe a notícia. Ele foi novo, quieto, sem reclamações, como sempre viveu a vida inteira. Lembro-me, que o único veículo de transporte que ele teve na vida foi uma bicicleta Hércules, que o levava e trazia do trabalho.

Já me perguntaram algumas vezes, se meu Natal passou a ser triste depois desse. Não! Nunca. As crianças estão aí preenchendo com alegria o lugar da tristeza, que às vezes insiste em brotar; e quando elas crescerem e se casarem, outras crianças virão. Crianças trazem alegria; as novenas de Natal, a esperança; a estrela de Belém nunca se apagará; e o Menino Jesus continuará na manjedoura. Como poderei ficar triste quando se anuncia o nascimento?

Para os artistas, não existem obras acabadas, elas são abandonadas por eles pelo caminho — lembrou-me um amigo. Ela foi junto com sua partida. A casa foi o presente que meu pai idealizou e ergueu com as mãos de pedreiro e alma do arquiteto que o nomeei. Ele a queria, talvez, bem mais aconchegante. Ele nos deixou assim seu presente de Natal para que um dia eu pudesse mexer e modificar a sua obra, tornando-a eterna. Com tijolos que ele mesmo assentou. Sua alma está lá. Assim, o Natal, sempre será comemorado sob o telhado que meu pai construiu.

Definitivamente, não existe Natal triste; sempre haverá o Natal, com a lembrança do baú de brinquedos que guardamos em nossa memória, em forma de saudade. FELIZ NATAL!

© Antônio de Oliveira / arquiteto e urbanista / dezembro de 2010.

domingo, 5 de dezembro de 2010

2010 – a pilha está acabando...

Faz uns dois meses fiquei sem computador. E a pior coisa é quando não dispomos da ferramenta e vem a ideia, o tema para algum texto. Onde anotar? Recorri ao método antigo: caneta e papel. Gastei um pouco de tinta da minha Lamy tinteiro numa folha de papel e escrevi 02 páginas de caderno. Fechei o caderno e não abri mais. Sabia que depois que reencontrasse o texto – já na tela do computador – teria que engolir algumas lágrimas em meio àquelas palavras. Então veio. Toda vez que escrevo textos intimistas é assim: engulo lágrimas. Dei o nome de “O presente de Natal”. Esta semana estará aqui postado.

Norma Jean queria só conhecer o pai. Se o tivesse conhecido na infância, talvez, vivesse uma vida normal até a fase adulta: casaria, teria filhos... Não encontraria o sucesso e morreria tão cedo, aos 36 anos. Pai às vezes faz falta à nossa vida. Norma era Marylin Monroe.

Um dia vou escrever sobre Marylin Monroe aqui.

Bem, 2010 está indo embora e minha pilha vai se acabando também. Acredito que este seja o último texto do ano. Este ano foram 21 crônicas. Espero para 2011, um ano com bastante inspiração e afirmações, estas coisas tão necessárias ao amadurecimento. Só tenho a certeza que iremos envelhecer por mais um ano que passou. Somente os sonhos, estes nunca envelhecem.

Postado por Antônio - Dezembro/2010